<opinião>
Quando alguém decide que vai ser médico, jornalista ou seguir qualquer outra carreira, essa pessoa pesquisa sobre o que vai ter que aprender, onde poderá trabalhar e quais caminhos deverá seguir para alcançar o reconhecimento. A pessoa também vai atrás de referências e de se manter atualizada sobre o mercado.
Se isso é uma verdade para qualquer carreira, por que é uma realidade tão distante para os escritores? Veja que aqui me refiro àqueles que desejam se profissionalizar, e não aos escritores que apenas querem ser publicados. Para estes, o caminho é parcialmente diferente. Falaremos deles em outra oportunidade. Agora, vamos voltar aos escritores profissionais.
O que tenho visto, seja em conversas diretas, seja acompanhando debates em grupos de redes sociais voltados aos escritores iniciantes, é um show de falta de informação sobre o mercado editorial, o processo de escrita de um livro e até mesmo sobre a escrita em si. E o que mais assusta é que gente com pouca experiência está aconselhando, ensinando e propagando erros a rodo.
Então, aqui vão minhas opiniões sobre afirmações que vejo com frequência nesses grupos:
- “Escritor não precisa ler” — é um absurdo tão grande que me sinto tola em gastar o meu e o seu tempo tocando no assunto. Ler é fundamental para qualquer profissão, ainda mais para a de escritor. Leitura aumenta vocabulário, auxilia na construção da coerência, facilita no uso da linguagem, entre outras vantagens. E digo mais: leia como um escritor. Perceba as escolhas de palavras, a forma de construção da história, a estrutura dos diálogos etc.
- “Escritor não precisa estudar, a escrita é um dom” — você pode mesmo descobrir um talento particular seu, que no início te fará se sentir muito especial e se destacar dos demais. Esse talento, se não for alimentado por estudo e conhecimento, logo mais será uma coisinha medíocre que não satisfará nem a você, nem a ninguém. Os grandes artistas podem ter se revelado ainda muito jovens com um talento nato, mas garanto que eles foram estudar as notas musicais, as cores e as palavras, para transformar aquilo que eles já tinham em algo ainda mais robusto e de qualidade.
- “As editoras estão ficando ricas às custas dos escritores” — deixa eu dizer uma coisa: ninguém está ficando rico no mercado editorial, muito menos as editoras. Quando uma editora investe em um escritor, ela é a única que o faz. Tudo, 100% dos investimentos para lançar e divulgar o livro sai do bolso dela, mas — se o livro for para uma livraria — ela fica para si com uns 20% do preço de capa. “Ah, mas o autor fica só com 10%”. Verdade, mas ele não investiu nada. Estou aqui falando de número, valores… matemática. Quando a editora recuperar o valor investido, só então ela começa a lucrar; enquanto isso, toda a cadeia já está lucrando, mesmo que pouco.
- “A editora é quem tem que fazer o marketing, e o autor escrever” — isso nunca foi verdade em tempo nenhum da literatura, hoje é menos ainda hoje. Ninguém vende melhor uma obra do que o autor, e em tempos de mídias sociais isso é ainda mais verdadeiro. Quando o autor deixa a divulgação e o marketing na mão da editora e se exime… bom, ele deve estar pronto para não conseguir publicar seu próximo livro. Editoras são empresas e precisam sobreviver; o livro e o autor precisam gerar lucro, ou deixam de ser interessante. Ah, não fui eu que inventei as regras de mercado.
- Agora, algo que não li, mas percebi. Se você deseja ser profissional, abandone o mais rápido possível as famosas “tretas”. Em geral, quem perde muito tempo com elas, vive ou vai viver de outra carreira, então pode se dar a esse luxo. Quem deseja viver de sua escrita precisa focar no que interessa: aprender, aprender e aprender.
Um bônus: viver exclusivamente da escrita no Brasil ainda é algo que não vi ninguém de fato conseguir. Somos um mercado relativamente pequeno e novo, em termos de leitores, e há uma concorrência forte com a literatura internacional. Tenha isso em mente todo o tempo. Busque saídas. Há muita gente que não vive da escrita, mas está no mercado. Essa também é uma alternativa.